Revista Nr 40 – Liberdade, Igualdade e Fraternidade

 

Liberdade, Igualdade e Fraternidade

Claudia Bonmartin

 

O século XVIII, que se caracteriza por um expressivo movimento cultural e filosófico na Europa, e sobretudo na França, é conhecido como Le Siècle des Lumières, o Século das Luzes, do Iluminismo. Grandes pensadores, tanto no campo da Ciência como no da Filosofia e da Arte (especialmente na literatura) fazem-se ouvir e apreciar quando apresentam suas reflexões, críticas e questões sobre la raison éclairée (a razão lúcida, o raciocínio iluminado, esclarecido) como também sobre a noção de liberdade.

A Ciência e a Filosofia tomam novas proporções e ganham o interesse de uma classe privilegiada. Os enciclopedistas oferecem o ‘direito à informação e à cultura’
trazendo uma infinidade de novos conhecimentos difundidos não somente na França como em outros países. Isto graças à imprensa e aos jornais que favorecem a
unidade e a renovação cultural de uma elite no poder e de uma elite intelectual. Esses pensadores-filósofos, intelectuais da sociedade de que faziam parte integrante e ativa, combatiam as opressões religiosas, morais e políticas da época. Opunham-se ao irracional, ao arbitrário, à superstição e propunham uma nova ética e uma nova estética. Essas novas ideias e novos conhecimentos eram conversação corrente nos salões dos nobres e dos burgueses, mas também nos cafés e nos clubes.
A influência deles foi tão significativa que suas obras e conceitos vão ter um papel preponderante na Independência dos Estados Unidos da América e na Revolução Francesa.

Os historiadores são unânimes em afirmar que a Revolução Francesa foi incontestavelmente um dos momentos mais importantes da história da França, e mesmo um momento forte da história da Humanidade. Em somente dez anos, ela vai modificar não só o contexto social, político e econômico do país, mas também  influenciar profundamente a Europa e o mundo. O povo começa a participar do destino de seu país, colocando fim à dominação de séculos da aristocracia e do clero. Trata-se, segundo psicólogos e psicanalistas, antes de tudo, de uma ‘crise de liberdade’: o indivíduo aspira poder assumir a liberdade de Ser Humano em toda a sua plenitude. No entanto, a saída dessa crise não se passa com a realização do tão ansiado desejo, nas no rigor napoleônico, que não emanava de um rei, mas de um imperador com muito mais poder.

Desses anos difíceis e cruentos, ricos de ideal mas também de muita violência, nasceu a Declaração dos Direitos Humanos e do Cidadão e também se conheceu por um curto período, mas pela primeira vez na Europa, o exercício da República. Foram progressos de inestimável valor, precursores de uma era mais justa para a França e para a Humanidade, mas a que preço!

Seguramente, considerando a evolução moral de todos nós há mais de 200 anos, não se poderia esperar melhor… Entretanto, houve sim, verdadeiros idealistas. Houve, sim, aqueles que sonharam com uma França mais justa, mais equitativa e mais fraterna. Houve, sim, aqueles que sinceramente sensibilizados diante
do sofrimento da massa popular desejaram para o seu povo uma ‘Douce France’ (uma França mais suave, mais amena) com menos sofrimentos e desigualdades. Mas os tempos eram de paixão, e mesmo vários daqueles que se apresentavam plenos de boas intenções nem sempre souberam manter a dignidade compatível com os ideais que defendiam.

Historiadores, Antropólogos, Psicólogos, Técnicos em Política se dedicaram e ainda se dedicam ao estudo aprofundado dessa época. Procuram compreender as incoerências e os reais motivos que provocaram ideais tão nobres e atitudes e comportamentos tão vis!

Se não nos cabe nestas páginas realizar um estudo desse período, convidamos o prezado leitor a uma reflexão espírita, que não terminaremos neste artigo, pois toda boa reflexão nos toma tempo. São questões que podemos colocar, a partir de informações espirituais que recebemos. E uma das mais interessantes, por nosso
amado Chico Xavier, que informou haver sido transferida para o Brasil, aqui passando a reencarnar, uma quantidade significativa de espíritos franceses da época de Kardec e da Revolução Francesa, os quais se encontram, na sua grande maioria, no movimento espírita.

Podemos então nos questionar: será que nesses 200 anos conseguimos fazer algum progresso? Verdade é que, como revolucionários, ainda não conhecíamos o Consolador Prometido, que só decênios depois surge com a Codificação, realizada por Allan Kardec. Mas hoje, sim, nós a conhecemos!

O Espiritismo veio, em tempo certo, ratificar a promessa de Jesus e vai, sob a luz do Seu Evangelho, ensinar-nos a praticar, em nossa vida cotidiana, a Liberdade, a Igualdade e a Fraternidade. Esses valores vividos em sua expressão mais sincera e verdadeira, não provocarão sofrimentos a outrem nem se transformarão em
vendaval destruidor como no passado. Nós os teremos no íntimo de nossos corações e saberemos ser pacíficos e positivamente ativos no trato com nosso semelhante e na sociedade em que nos encontramos.

O Espiritismo vem também confirmar a necessidade e o valor da educação e do conhecimento (tão defendidos pelos Iluministas e pelos Revolucionários), quando os Espíritos nos deixam um novo mandamento: Instruí-vos! Eles sabiam que sem a Educação o homem nunca seria livre e lúcido o suficiente para bem viver sua própria vida. Kardec também nos diz que o Espiritismo deve acompanhar o desenvolvimento da Ciência e não foi por acaso que, para a realização da Codificação, um eminente pedagogo haja sido escolhido pelo Alto. Kardec, à sua maneira, foi um enciclopedista. Soube organizar em cinco livros todo um acervo de conhecimentos
ditados pelos Espíritos, acervo este que toca em inúmeros aspectos do conhecimento em geral. Sua obra, apesar de profunda e abrangente, é sintética e está ao alcance de todos. Ela é para ser lida e difundida democraticamente, pois não é necessário ser um intelectual para compreendê-la, apesar da crescente admiração de intelectuais por ela.

Quanto à liberdade, o Espiritismo é, antes de tudo, uma doutrina de liberdade e, por consequência, de responsabilidade – que foi o que faltou aos revolucionários que rapidamente transformaram liberdade em anarquia.

Quanto à igualdade, todos, sem exceção, viemos de Deus e a Ele voltaremos e, se Ele nos “condenou” em algum momento a alguma coisa, foi à felicidade e à perfeição.

No que diz respeito à fraternidade, a divisa do Espiritismo é Fora da Caridade não há Salvação. Caridade aqui compreendida como fraternidade, solidariedade,
como compaixão, como a expressão mais sublime do amor ativo que Jesus nos ensinou: fazer ao nosso próximo aquilo que gostaríamos que ele nos fizesse. Também temos nos ensinamentos espíritas outra divisa: Trabalho, Tolerância e Solidariedade, que confirma a necessidade de ação compreensiva e tolerante de nossa parte em relação ao nosso próximo em todos os momentos de nossa vida.

Como conclusão, podemos afirmar que nós, os espíritas, somos privilegiados. E o somos pelos conhecimentos de vanguarda, elucidativos e de uma clareza ímpar, que nos traz o Espiritismo. Ele responde como nenhuma outra doutrina às questões mais profundas e pertinentes do nosso tão atribulado e conflituoso mundo
atual, como também do nosso mundo íntimo. E a pergunta de reflexão pessoal é: como estamos vivendo todas essas bênçãos de conhecimento e amor em nossos atos? E dentro do nosso movimento espírita?  Pacificamos os nossos corações ou continuamos egocêntricos e belicosos?

E enquanto, com orgulho, o francês exclama: Vive la République! Vive la France! Nós, espíritas, podemos tranquilamente, alegremente, agradecidamente e com nobre e justo orgulho, clamar a todos os ventos: Viva Jesus! Viva Kardec!

 

Fonte de pesquisa: Internet – Les valeurs de la Révolution Française.

 

Claudia Bonmartin é educadora e presidente do CESAK – Centre d’Études Spirites Allan Kardec de Paris, cidade onde reside.